segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Com o fucinho na botija! by Danila Thomaz



Com o fucinho na botija!
Entendendo se os cães se sentem culpados por Danila Thomaz

Você chega em casa e seu sofá tão querido e macio está parecendo que foi retalhado pelo Jason numa sexta-feira treze.  Se você tem um cão na sua casa sabe exatamente como é aquela cara de coitadinho que eles fazem quando são pegos com o focinho na botija. É aquela típica expressão canina: orelhas e olhos baixos e o rabo muitas vezes abanando freneticamente no meio das patas. O Goofy, meu salsinha, é craque na arte de aprontar. Se ele estivesse na escola seria primeiro aluno na matéria “como aprontar na casa do seu humano“. Além da expressão típica canina, o cara de pau ainda se vira com as patas pra cima e se dobra todo quando leva uma bronca.
Essa situação tão corriqueira para nós, donos de cachorro, nos faz concluir de imediato: os cães sabem que fizeram algo errado e se sentem realmente culpados por terem aprontado. Ah é só olhar pra cara dele! Mas será mesmo que nossos fofos deitam a cabeça pra dormir e ficam se sentindo mal por terem decapitado o salto do nosso sapato, feito xixi na nossa cadeira querida, terem roubado nossa comida ou terem abusado sexualmente da perna da nossa visita?
A cientista comportamental Alexandra Horowitz foi a fundo nessa questão. Em experiência realizada nos Estados Unidos ela reuniu alguns cães, seus donos e algumas guloseimas. Os humanos deveriam deixar seus cães sozinhos com os petiscos em uma sala. Antes de saírem do recinto, os donos avisaram seus cachorros que estava determinantemente proibido abocanhá-los. No meio tempo em que os donos saíram da sala a pesquisadora deu alguns petiscos “proibidos” para uma amostra do grupo e avisou aos donos que todos eles haviam se comportado mal e comido as guloseimas. Quando os donos voltaram irritados com o comportamento de seus peludos, advinhem? Eles relataram à pesquisadora que seus cães expressaram a cara de culpa. Isso ocorreu mesmo com aqueles cachorros que não tinham “desobedecido” à ordem inicial do dono. Na realidade, segundo ela, os cães que não haviam desobedecido apresentavam ainda mais aquela clássica postura de culpa. Em outras palavras, concluiu-se que essa tal cara de culpa ocorria simplesmente por terem sofrido uma repreensão, independentemente de terem desobedecido.
Alexandra afirmou que nós projetamos valores humanos em nossos animais, o que ela define como o fenômeno da atropomorfização. É como se olhássemos pra nossos cães e pensássemos que dentro daquele corpinho peludo existe um pequeno ser humano que já nasce sabendo o que é permitido ou proibido no mundo humano. Além do mais, sentir culpa significa ter noção de alguns valores implícitos no seu meio de convivência. Segundo a Wikipedia (Aurélio pra quê) sentimos culpa quando violamos uma consciência moral pessoal. É muito mais do que simplesmente ter noção de que algo esteja certo ou errado e suas consequências. O sentimento de culpa é um processo mental mais complexo atrelado a um código moral aonde estamos inseridos, criado por uma cultura que literalmente passa de pai pra filho e não de humano para cão.
Acreditem, a mente dos cães funciona a todo vapor. Entre desfazer aquilo que se parecia outrora com o seu sofá e levar a bronca no final do dia ele já descobriu diversos barulhos e cheiros. Para um cão um minuto depois de ter feito algo errado do ponto de vista humano, já se formou uma distância grande para ele  associar a repreensão à bagunça.
Segundo a cientista os cães aprenderam ao longo de sua história a reagir aos nossos comportamentos para se comunicarem conosco. Ao dar uma bronca, mesmo aquela silenciosa que damos só com o olhar, a sua expressão, o seu tom de voz, sua postura corporal e até sua energia se modificam. Você não nota isso, mas seu cachorro é  um especialista em lhe observar, praticamente um antropólogo no que tange ao comportamento humano. Ou seja, a clássica reação de “culpa” é inspirada pela repreensão em si dada pelo dono e não ao ao fato de ter feito algo errado e se sentir culpado por isso. Aliás já foi observado que os cães têm a praticamente a mesma reação quando estão com medo ou mostrando submissão.
Eles simplesmente associam que após aquele seu olhar arregalado virá uma bronca pela frente e uma sensação de desconforto do ponto de vista canino, que diga-se de passagem, espera-se que seja algo limitado a um olhar mais firme, uma voz um pouco mais alta ou aquela batidinha de pé. Mulheres, isso vale inclusive pra fase de TPM.
Por isso, humanos de plantão, chegar em casa e ir dando de cara uma bronca no seu cão e ainda esperar que ele entenda isso e mude seu comportamento daqui pra frente, tem praticamente a mesma probabilidade de você virar um milionário da noite pro dia. Além do que, isso pode frustar afetivamente seu cachorro que o está esperando o dia todo para lhe receber e ser bem recebido. Abra a porta da sua casa e aproveite todas as lambidas, pulos (que eu particularmente gosto bastante do meu baixinho) e entre na festa com eles! Aos humanos só está dispensada a abanada de rabo que deixaremos por conta dos peludos, excelentes entendedores dessa arte!
Fontes:
HOROWITZ, Alexandra. A Cabeça do cachorro.Rio de Janeiro, 2010. p. 280-287
ROSSI, Alexandre. Adestramento Inteligente: com humor, amor e bom senso. São Paulo, 1999. p. 93
VIEGAS, Jennifer. Do Dogs Ever Feel Guilty? Disponível em <http://www.petpeoplesplace.com/resources/articles/dogs/do-dogs-ever-feel-guilty_2.htm>
Wikipedia

Nenhum comentário:

Postar um comentário